O chamado que veio pela força
- Marcia Fabiana
- 29 de set.
- 2 min de leitura
Aquela noite não passou em branco.
Deixou marcas no corpo, na alma — e, principalmente, no coração da minha mãe.
Ela estava estagnada, tomada pela emoção, repetindo que o Sagrado havia me chamado.
Dizia que eu havia sido tocada por algo profundo, maior do que todos nós, e que precisava me desenvolver espiritualmente.
Segundo ela, eu havia sido conectada.
Mas vocês já sabem: nunca fui fácil de convencer.
Minha mente sempre foi inquieta, minha fé, desconfiada.
Minha mãe me explicou com carinho que, ao desafiar o invisível naquela noite, eu havia provocado algo poderoso.
Que precisei ver para crer.
E que o Sagrado, por compaixão e sabedoria, me respondeu — na mesma intensidade com que fui desafiadora.
Ela disse que ali, naquele chão onde me debati e chorei, eu havia recebido os Orixás da Umbanda.
Uma religião brasileira, rica, ancestral, que mistura raízes africanas, indígenas, católicas e até kardecistas.
Mas isso… eu explicarei melhor mais à frente.
Por agora, o importante é contar como me senti.
Ouvi tudo o que me disseram.
Tentei compreender.
Por um instante, me deixei encantar.
Mas logo as memórias voltaram:
— A separação dos meus pais.
— As brigas.
— As acusações de feitiçaria.
— O medo do catimbó.
Como eu poderia aceitar aquilo na minha vida?
Levantei os olhos, firme, e disse em voz alta:
“Não. Não aceito. Não quero isso pra mim. Pode até existir, eu senti… mas não é minha escolha.”
Foi então que aconteceu algo ainda mais inexplicável.
Uma tontura tomou conta de mim.
E, de repente, eu não era mais eu.
Falava em outra língua — algo parecido com espanhol antigo, talvez um dialeto.
Mas falava com calma, sorrindo, explicando coisas à minha mãe e aos amigos que ainda estavam ali.
Peguei um cigarro — eu, que sempre odiei cigarro.
Pedi vinho — eu, que sempre rejeitei álcool.
Sentei no sofá com naturalidade, fumei, bebi… e falei.
Disse, com serenidade:
“Essa moça aqui (apontando para mim mesma) não vai aceitar fácil. É teimosa. Mas o tempo vai mostrar. Muitas coisas vão acontecer até que ela entenda e aceite a missão.”
Logo em seguida, voltei a mim.
Enjoada. Cuspindo.
Assustada.
“Como assim?” — gritei.
“Agora tomam meu corpo e fazem o que querem?”
Minha mãe, com paciência, explicou:
“Eles não vieram para invadir. Vieram para curar.
Vieram para pedir passagem, para te mostrar quem são…
e para que você, um dia, possa aceitá-los com consciência, não por imposição.”
E foi assim…
Sem manual, sem aviso, sem escolha prévia.
Foi assim que se deu o início da minha mediunidade.
Foi assim que os Orixás e os guias da Umbanda começaram a chegar.
Chegaram para curar, ensinar… e revelar a missão que, até então, eu tentava negar.
Marcia Fabiana




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