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O chamado que veio pela força


Aquela noite não passou em branco.


Deixou marcas no corpo, na alma — e, principalmente, no coração da minha mãe.


Ela estava estagnada, tomada pela emoção, repetindo que o Sagrado havia me chamado.


Dizia que eu havia sido tocada por algo profundo, maior do que todos nós, e que precisava me desenvolver espiritualmente.


Segundo ela, eu havia sido conectada.

Mas vocês já sabem: nunca fui fácil de convencer.


Minha mente sempre foi inquieta, minha fé, desconfiada.


Minha mãe me explicou com carinho que, ao desafiar o invisível naquela noite, eu havia provocado algo poderoso.


Que precisei ver para crer.


E que o Sagrado, por compaixão e sabedoria, me respondeu — na mesma intensidade com que fui desafiadora.

Ela disse que ali, naquele chão onde me debati e chorei, eu havia recebido os Orixás da Umbanda.


Uma religião brasileira, rica, ancestral, que mistura raízes africanas, indígenas, católicas e até kardecistas.


Mas isso… eu explicarei melhor mais à frente.


Por agora, o importante é contar como me senti.

Ouvi tudo o que me disseram.


Tentei compreender.


Por um instante, me deixei encantar.


Mas logo as memórias voltaram:


— A separação dos meus pais.


— As brigas.


— As acusações de feitiçaria.


— O medo do catimbó.

Como eu poderia aceitar aquilo na minha vida?

Levantei os olhos, firme, e disse em voz alta:


“Não. Não aceito. Não quero isso pra mim. Pode até existir, eu senti… mas não é minha escolha.”

Foi então que aconteceu algo ainda mais inexplicável.


Uma tontura tomou conta de mim.


E, de repente, eu não era mais eu.


Falava em outra língua — algo parecido com espanhol antigo, talvez um dialeto.


Mas falava com calma, sorrindo, explicando coisas à minha mãe e aos amigos que ainda estavam ali.

Peguei um cigarro — eu, que sempre odiei cigarro.


Pedi vinho — eu, que sempre rejeitei álcool.


Sentei no sofá com naturalidade, fumei, bebi… e falei.

Disse, com serenidade:


“Essa moça aqui (apontando para mim mesma) não vai aceitar fácil. É teimosa. Mas o tempo vai mostrar. Muitas coisas vão acontecer até que ela entenda e aceite a missão.”

Logo em seguida, voltei a mim.


Enjoada. Cuspindo.


Assustada.

“Como assim?” — gritei.


“Agora tomam meu corpo e fazem o que querem?”

Minha mãe, com paciência, explicou:


“Eles não vieram para invadir. Vieram para curar.


Vieram para pedir passagem, para te mostrar quem são…


e para que você, um dia, possa aceitá-los com consciência, não por imposição.”

E foi assim…


Sem manual, sem aviso, sem escolha prévia.


Foi assim que se deu o início da minha mediunidade.


Foi assim que os Orixás e os guias da Umbanda começaram a chegar.


Chegaram para curar, ensinar… e revelar a missão que, até então, eu tentava negar.

Marcia Fabiana


 
 
 

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